OS LIVROS PROFÉTICOS
Os Profetas em geral
A palavra profeta não significa necessariamente
“aquele que prediz o futuro”, mas sempre designa “aquele que fala em nome de
Deus”, seja para predizer o futuro, seja para interpretar o presente.
Os profetas, assim entendidos, sempre existiram no
povo de Israel a partir de Abraão, o confidente do Senhor Gn 18,17-19). A primeira mulher tida como
profetiza é Maria irmã de Moisés; Ex
15,20. A partir de Samuel (séc Xl a.C.) até Malaquias (séc V a.C.), a série dos
profetas foi ininterrupta. Também na época de Samuel e depois, floresceram os
chamados “colégios de Profetas” (lSm 10,5; 19,20; lRs 20,35; 2Rs 2,3.5.7.15; Am
7,14); eram comunidades que viviam em pobreza (2Rs 4,36s; 6,1-6) e obediência
(lSm 19,20; lRs 22,11; 2fRs 2,3,5.7,15.. .); os seus membros entravam em êxtase
sob o influxo de sugestão individual ou cóletiva (lSm 10,10-12; 19,20-24),
impulsionacios por música, canto e dança (lSm 10,5; 2Rs 3,15).
Os profetas exercem paper importante na história
de Israel; eram conselheiros dos reis, que os dissuadiam de fazer alianças com
povos estrangeiros (pois estas levavam facilmente o povo á idolatria), ou
censuravam as injustiças e os abusos cometidos na corte ou pelo povo; reprimiam
a idolatria e os falsos cultos que se infiltravam na praxe da população
israelita.
Houve, sem dúvida, falsos
profetas: alguns, sem ter chamado divino, se
apresentavam como profetas para ganhar dinheiro (1Rs 22,13; Is 30,10; Mq 2,11; 3,5.11);
procuravam justificar os vícios em vez de os censurar devidamente (Jr 23,9,40;
Ez 13,1-16; Jr 14,14-15); anunciavam falsas calamidades ou ocorrências (Dt
18,20-22; Mq 3,5; Jr 28,9); eram negligentes no cumprimento do seu dever (Ez
3,17-21; 13,22s; 33,2-4).
Antes do exílio (587-538),
os profetas tinham a missão de mostrar ao povo e aos reis as suas faltas, em
virtude das quais o Senhor Deus os entregaria aos estrangeiros; lutavam não só
contra os falsos cultos, mas também contra o otimismo que animava os ouvintes
com relação ao futuro da nação (Is 22,13s; Jr 21,8s; 28,1-17). Sobressairam
então lsaías, Jeremias, Oséias e Amós.
Durante o exílio na Babilônia, os profetas
procuraram erguer o ânimo do povo, sustentando-lhe a esperança abatida pelo
duro golpe recebido dos estrangeiros. Veja Ezequiel e o chamado “segundo
lsaías” (Is 40-55), que acompanharam o povo na Babi1ônia Ez 16,1-63; 20,39-44;
36,16-38; 40-48; Is,45,1-25; 48,20-22; 50,1-11...
Depois do exílio, Ageu, Zacarias e Malaquias
incentivaram o povo a reconstruir o templo, os muros e a cidade de Jerualém e a
empreender a reforma religiosa, moral e social da comunidade judaica,
predizendo a glória do futuro Messias.
Os escritos dos profetas são, por vezes, obscuros e de dificil interpretação. Isto se deve a diversas causas:
1) Os profetas geralmente
anunciavam seus oráculos de viva voz; eles mesmos ou seus discípulos escreviam
um resumo da pregação oral..., resumo que não podia deixar de ser lacônico em
muitos casos.. Faltava-lhe o complemento dos gestos que acompanhavam as palavras
dos profetas; Ez 6,11; Ez 21,lls.17.
2) Os oráculos dos
profetas estão profundamente inseridos no seu contexto histórico e geográfico.
Por conseguinte, os profetas aludem a acontecimentos da sua época, que ao
estudioso moderno não são devidamente conhecidos, o que dificulta o entendimento do texto
bíblico, Sf 1,11; Na 1,11; 2,8; 3,8; Mq 4,8...
3) A linguagem dos profetas, de acordo com o
estilo dos orientais, recorre a expressões e imagens hiperbólicas, que deixam o
leitor, por vezes, confuso. Is 2,2-4; 9,5; 11,6-8; 65,25; Mq 4,3; 5,4-9; Ez
34,25...
4) As visões referentes ao
futuro carecem de perspectivas, isto é, os acontecimentos futuros que não são
simultâneos, são vistos como se fossem simultâneos; as fases preparatórias e as
fases finais do mesmo evento são descritas numa só cena, sem atenção à ordem
cronológica. Por exemplo, em Is 7-11
a salvação messiánica é apresentada como se coincidisse
com o fim do cativeiro assírio; em Is 40-55 a volta do exílio parece ser o prelúdio
imediato do Reino messiânico; o mesmo se diga a respeito de Zc 9,1-17; Dn
9,20-27,
5) A descrição da era
messiânica e do próprio Messias é sempre fragmentária. Nenhum profeta descreve
a obra do Messias em sua totalidade. Assim o Messias aparece como rei vitorioso
em Is 24-27; Ez 38s; JI 4;... como Rei pacifico em Os 3,5; Am 9,11-15; Is
9,1-7; 11,1-8;.. . como Mestre em Is 2,3; 54,13; Mq 4,2; Os 10,12;... como
sacerdote em Jr 33,14-26; Ez 40-48; Zc 6,9-14;. ,. como Servidor padecente em
Is 52,13-53,12.
Tomando por critério a
extensão dos respectivos livros, os profetas são distribuídos em duas
categorias: a dos maiores, compreendendo Isafas, Jeremias (com Lm e Br),
Ezequiel e Daniel; e a dos menores, compreendendo Oséias, Joel, Amós, Abdias,
Jonas. Míquéias, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias.
ISAÍAS
Isaías (770-687 a .C.) era filho de
ilustre familia de Jerusalém, erudito poeta e estilista. Chamado em 740 para a
missão profética (6,1), foi conselheiro dos reis Joatã, Acaz e Ezequias numa
época em que a infidelidade religiosa e moral grassava na corte e no povo
judeus.
A partir do séc. XVIII, os
críticos discutiram a unidade do livro de Isalas. Após muitas dúvidas, hoje os
autores católicos (e, com eles, o magistério da Igreja) admitem ‘haver três
partes bem distintas no livro de Isaias: ‘a primeira (cap. 1--39) seria do séc.
VIII a.C., ou seja, dos tempos do próprio profeta; a segunda (cap. 40-55)
dataria do exílio babilônico (587-538
a .C.); a terceira (cap. 56-66) terá sido escrita após o
exílio, na época da restauração do povo em sua terrá. Por isto o livro de
Isaías é atribuido à escola de Isaías; os discípulos deste profeta terão
continuado a obra do mestre através dos séculos. Examinemos cada quel dessas
partes.
O 1º Isaías (1--39). Nesta
seção o bloco 36-39 constitui uma parte de índole histórica; tem seu paralelo
em 2Rs 18,13-20,19. Julga-se ue não provém da pena de Isaías, pois se refere a
acontecimentos provavelmente posteriores à morte deste. A ordem cronológica dos
fatos exigiria que os cap. 38--39 fossem lidos antes de cap. 36--37.
O conjunto Is 1-35 supõe as condições históricas
em que viveu o profeta Isaias no séc. VIII a.C. Consta de várias coleções de
dizeres, dispostas sem estrita ordem cronolágica. A maior parte desses oráculos
deve ter sido redigida pelo próprio profeta Isaías, como atestam Is 30,8; 8,1 e
os cap. 6-8 (que contém traços auto- biográficos). Admite-se, porém, que certas
seções de Is 1--35 receberam sua forma literária definitiva por parte dos
discípulos do profeta (Is 8,16); estes confrontavam entre si os discursos do
mestre e os reuniam em coleções de acordo com o tema que abordavam. É possível
que essas diversas coleções só tenham sido coletadas em um volume após o exílio
ou cerca de 200 anos após a morte do profeta.
Is 1--35 contém notáveis
profecias messiânicas. Em Is 7,10--25 o Messias aparece como o Emanuel (= Deus
conosco), que há de nascer de uma jovem (que no texto grego dos LXX é dita
“virgem”); Is 7,14. Em 9,1-7 nasce o Menino prometido como “Admirável
conselheiro, Deus Forte, Pai do século futuro, Príncipe da Paz” ( 9,5). Em
11.1-9 o tronco de Davi floresce e produz um rebento, que é o Messias. Este faz
descer sobre a terra a plenitude do Espírito do Senhor e cumpre as promessa de
restauração da natureza violentada pelo pecado.
Por estes vaticínios lsaías se impõe como um dos
maiores profetas do Antigo Testàmonto.
O 2º Isaías (40--45). Este
bloco se deve a um autor ou a autores anônimo(s) (Dêutero ou Segundo lsaías),
que pregaram e escreveram na Babilônia, anunciando aos israelitas aí deportados
a iminente libertação e a volta à Terra Santa (sec. VI a.C.).
A situação histórica
suposta por Is 40--55 difere da do séc. VIII (Is 1-35): os remos de Samara e
Judá já não existem; os seus cidadãos foram despojados e deportados, em castigo
de suas infidelidades; 42,18-25;
43,5-7.26-28; 47,6; 52,5; Jerusalém e o
Templo estão destruídos e a sua restauração é profetizada: 44,26-28; 45,13; 49,15-17.19; 52,9; a nação
que retém os judeus, é Babilônia, opulenta e arrogante, mas prestes a cair em
ruínas; 47,5-9; o rei Ciro da Pérsia
parece conhecido aos leitores; Javé o dirigirá contra a Babilônia; 46,1-13; 47,1-11; os leitores são estimulados
à confiança e à alegria, pois se aproxima o fim do exílio; 40,l0s.27; 41,10-13; 46,12s; 48,20.
Tem-se a impressão de que o autor dos dizeres está
fisicamente presente aos seus ouvintes, pois os interpela em tom vivo e
caloroso; 40,21.26.28; 43,10; 48,8;
50,10... Nunca dirige palavras condenatórias contra Israel, mas apenas contra
Babilônia; 41,11-16; 42,14-17; 43,14s. Os oráculos de consolo são marcantes,
predizendo o cumprimento das antigas promessas messiânicas (41,25-29; 46,8-12),
a libertação do povo e a travessia pelo deserto em demanda da Terra Santa
(41,17-20; 43,1-7; 49,7-26), a glória da futura Jerusalém (51,17-52,2;
54,1-3.11-17), a conversão dos gentios (45,14-17.22-25; 55,3-5).
Inseridos em 40--55, estão
os quatro “Cânticos do Servo de Javé”, que falam da expiação prestada por um
Servo Inocente em favor dos seus irmãos pecadores. São profecias messiânicas,
que projetam nova luz sobre o sentido do sofrimento; este pode recair sobre os
justos, que assim prestam satisfação pelos pecados alheios. Dispõem-se do
seguinte modo: Is 49,1-6: a vocação do Servo de Javé; Is 42,1-4: os predicados
do Servo de Javé; Is 50,4-9: a Ingrata missão do Servo de Javé; Is 52,13-53,12:
a morte e a glorificação do Servo de Javé.
Estes cânticos, assim esparsos no bloco 40--55,
parecem ter origem independente deste conjunto, que não é possível reconstituir
com clareza.
O 3º Isafas (56-66).
Difere de Is 1--35 e Is 40--55 tanto por seu fundo histórico como por sua
temática e seu estilo. Sim; trata de consolar e exortar os judeus recentemente
repatriados do exílio. Israel, de novo na Terra Santa, constitui uma comunidade
religiosa; parece, porém, que é infiel à Lei do Senhor; está desanimado diante
dos obstáculos que se opõem à reconstrução do Templo e da Cidade Santa; os
próprios anciãos e maiorais. se mostram indignos de suas funções. Não obstante,
o profeta reafirma as antigas promessas de Javé, principalmente as que se
referem à nova Jerusalém, ponto de convergência tanto dos judeus fiéis como dos
pagãos convertidos ao Senhor na era messiânica,
Vejamos, por exemplo, como
a situação histórica de Is 56-66 já não é a do exílio (587-538 a .C.): o povo já habita a
montanhosa e acidentada região da Palestina (Is 57,5-7), que contrasta
com as planícies da Babilônia, Irrigadas por belos canais Jerusalém se acha
parcialmente povoada, mas ainda não devidamente reconstruída; 60,10; 61,4; as
cidades menores da Terra Santa ainda se encontram devastadas; 64,9; o Templo Santo ainda está em ruínas
(64,lOs), embora já se pense em reconstrui-lo (66,1); o povo vive angustiado não por causa da opressão
de inimigos, mas em virtude da infidelidade dos próprios judeus; 57,Ç3-5; 59,9-12; 61,1-3; 63,18s; os chefes
da comunidade ocupam-se mais consigo do que com o povo; 56,10-12; contudo o Senhor enviará sua salvação, mas
não por obra de Ciro ou do Servo de Javé; 60,22; 61,1-3; 62,7s; 66,12s; o
Senhor promete a reconstruçao do Templo (56,5-8, 58,2, 62,9, 66,6.20), que será
famoso centro do culto de Javé (cf. 60,7.13).
O Profeta, em Is 56-66,
deixa de ser propriamente o Consolador, para fazer as vezes de Pastor, Doutor e
Salmista. Lembra as severas exigências do culto e da Lei do Senhor, em
particular o sábado (56,2,4-6; 57,6-12; 58,13s; 65,1-6; 66,3s). Repreende os
idólatras e infiéis (56,8-57,13; 58,1-5; 66,17). Recita profissões de fé e de
penitência (59,1-4; 63,7-64,11). Transmite instruções a respeito do jejum e da
oração (58,1-12).
É de crer que o bloco 56--66 seja uma coletânea de
oráculos devidos a diversos autores, que deram origem ao livro chamado “o
Terceiro (o Trito)-Isaías”.
Vê-se, pois, que diversas
mãos concorreram para confeccionar o livro de Isaías tal como ele hoje se
encontra, sendo que a última redação do volume se deve ao ano de 400 a .C. aproximaclamente; os
últimos redatores terão efetuado ou confirmado a compilação de Is 1-39, 40-55,
56-66, dando ao conjunto a forma estilística e doutrinária que atualmente o
caracteriza.
O livro de Isaías
deixou-nos profecias messiânicas tão vivas que Isaias é chamado “o Evangelista
do Antigo Testamento”.
JEREMIAS
Ao profeta Jeremias são atribuidos o livro de
profecias e o das Lamentações.
Jeremias (650-567 a .C.) nasceu em Anatot,
perto de Jerusalém. Por volta de 626, foi chamado à missão de profeta (1,2;
25,3), que ele exerceu em circunstâncias muito dificeis. O reino de Judá era
cada vez mais ameaçado por adversários; ora Jeremias devia dizer ao rei e ao
povo que não fizessem alianças políticas com estrangeiros, mas se submetessem
aos babilônios, que acabaram destruindo Jerusalém em 587. Por causa do teor de
sua pregação, Jeremias foi duramente perseguido: em sua cidade de Anatot, os
concidadãos quiseram cordená-lo à morte, porque lhes censurava os costumes
(11,18-12,6). Jeremias transferiu-se então para Jerusalém e, pelo mesmo motivo,
foi colocado no cárcere pelo sacerdote Fassur (18,1-20,6). Libertado da prisão,
predisse a ruína da Cidade Santa e do Templo e, por isto, foi condenado à morte
pelos sacerdotes e os falsos profetas, mas escapou, mais uma vez, da morte
(26,1-19).
Em 605, Jeremias ditou ao seu secretário Baruc os
oráculos que ele tinha proferido desde o começo da sua missão ou desde 626
(36,2); Baruc leu-os para o povo no Templo. Então o rei Joaquim, de Judá,
mandou queimar esse escrito (36,27). Em consequência, o profeta os ditou de
novo, acrescentando-lhes ainda outros vaticínios (36,32). O rei Sedecias,
posterior a Joaquim, mais de uma vez mandou encarcerar Jeremias como traidor da
pátria (37-39). Jerusalém tendo caído sob os golpes de Nabucodonosor em 587,
Jeremias foi libertado da prisão e quis ficar na Terra Santa, junto a Godolias,
que o invasor colocara como Prefeito à frente de Judá (40,1-6). Todavia
Godolias foi assassinado por judeus, que fugiram para o Egito levando consigo o
Profeta (42,1-43,13). Neste país, Jeremias ainda exortou a sua gente à
penitência (44,1-30). Reza a tradição, à qual parece aludir Hb 11,37, que
Jeremias morreu apedrejado pelos judeus que não o queriam ouvir no Egito.
Jeremias era dotado de grande sensibilidade, de
modo que sofreu profundamente durante toda a vida de profeta. Desde o início, o
Senhor lhe disse que deveria “arrancar e destruir, exterminar e demolir”
(1,10). Ele tinha que anunciar a desgraça numa atitude aparentemente derrotista
e antipatriótica (20,8-10); os reis, os sacerdotes, os falsos profetas e o povo
o tinham como “homem discutido e debatido pelo país inteiro” (15,10). A dor que
tal situação lhe causava, exprime-se frequentemente através das “confissões” ou
relatos autobiográficos de Jeremias; 12,1-6; 15,lOs.15-21; 20,7-13.14-18.
Apesar dos seus momentos de fadiga, o profeta reagia sempre, depositando
finalmente sua confiança em Deus: “Louvai Javé, pois livra a alma do pobre das
mãos dos perversos!” (20,13).
Por ter sido o homem das dores, Jeremias é tido
como figura do Cristo Jesus; é o tipo do arauto da Palavra de Deus que sofre
duras contradições por ser fiel à sua missão. Pelo mesmo motivo, Jeremias dá
início, na história do povo de Deus, à corrente dos “pobres (anawim) de Javé”;
em tal contexto, pobre é aquele que carece de amparo humano e, por isto mesmo,
mais se apoia em Deus; conserva a fé e a confiança numa alma destituída de
qualquer presunção ou arrogância.
O livro de Jeremias contém os testemunhos dos
quarenta anos de pregação do profeta (626-586). A história político-religiosa
desse período está, de certo modo, retratada em seus vaticínios; a ordem destes
não é rigorosamente lógica nem cronológica. Como quer que seja, o livro pode
ser dividido em três partes:
1) 2-25, oráculos contra Judá e Jerusalém;
2) 26-45, notícias biográficas sobre a atividade
de Jeremias desde o início do reinado de Joaquim até a queda de Jerusalém e a
fuga para o Egito;
3) 46-51, oráculos contra os gentios. Á guisa de
prólogo, é narrada a vocação de Jeremias (cap. 1) e, em estilo de apêndice, há
notícias sobre o fim de Jerusalém (cap. 52).
Deve-se notar que existe
grande diferença entre o texto hebraico de Jeremias e o texto grego dos LXX.
Este é muito mais breve, dado que aí falta quase a oitava parte ou
aproximadamente 2.700 vocábulos do texto hebraico. Essas omissões, às vezes, versam
sobre palavras de pouca importância, mas em vários casos tocam versículos ou
mesmo passagens inteiras (29,16-20; 33,14-26; 39,4-13...). Além do mais, o
texto grego apresenta outra ordem de vaticínios, pois após 25,13a vêm os
oráculos contra os gentios (46--51 do hebraico), dispostos de modo próprio.
Não é fácil explicar esta divergência. A sentença
mais provável admite duas recensões do texto hebraico: uma mais longa, e outra
mais breve; a partir desta, terá sido confeccionada a tradução dos LXX. Além
disto, podem-se admitir omissões e interpolações do texto por parte dos
tradutores.
O livro de Jeremias é de rico conteúdo. Eis alguns
traços importantes da sua mensagem:
a) O livro é, em muitas de suas partes, o espelho
da piedade e dos íntimos sentimentos de Jeremias em relação a Deus e ao seu
povo. Especialmente as passagens ditas ‘Confissões” testemunham a familiaridade
do profeta com o Senhor Deus: 11,18-23; 12,1-6; 15,10-21; 17,12-18; 18,18-23;
20,7-18 (o autor propõe a Deus as suas indagações, os seus gemidos e as suas
preces). Ocorrem, sim, sentimentos de vingança (12,13; 17,18; 18,21-23), de
desânimo (12,3; 15,10.16s; 20,7-10), mas superados por palavras de
encorajamento e confiança (12,5; 15,19-21; 20,11-13) e de verdadeiro amor ao
povo de Judá ameaçado (4,19-21; 8,21-9,1; 14, 1-i5,5.i1; 1820). A oração de
Jeremias tem grande valor junto a Deus (7,16; 11,14; 14,11).
b) A nova e definitiva Aliança é descrita a partir
da experiência pessoal e mística do profeta: a Lei de Deus estará gravada nos
corações (31,31-33 e 24,7; 32, 39); todos conhecerão a Deus no seu íntímo
(31,34a) e receberão o perdão dos pecados para levar a vida nova (31,34b;
33,8). O Messias será Filho de Davi e instaurador de nova ordem (23,1-8).
Merecem ser lidas atentamente as passagens seguintes, em que a volta do exílio
e a ordem messiânica são descritas simultaneamente: 31,10-23; 33,6-22.
Confira-se Hb 8,8-13; 10,15-17; ML 26%28; Jo 4,42; 2Cor 3,2.6.14; lJo 2,12-14.
Jeremias, maltratado
durante os anos de sua missão, foi exaltado pelos pasteres, que lhe atribuiram
grande autoridade. Foi tido como o amigo e o intercessor de seu povo junto a
Deus no além; 2Mac15,13-15; 2,1-8. É citado em Dn 9,2 e Eclo 49,7-9. Propondo
uma Aliança nova fundada sobre a religião do coração, Jeremias tornou-se o pai
do judaísmo em sua corrente mais pura; exerceu influxo em Ezequiel (Ez
36,23-32), no 2º Iaías (Is 49,1; 52,13-53,12) e em vários salmos (SI 138 ou
139; 39 ou 40; 41 e 42 ou 42 e 43...). A sua vida de abnegação a serviço de
Deus o fez imagem do Servidor de Javé (Is 53), que é o próprio Cristo.
O livro das Lamentações
As Lamentações vêm a ser uma coleção de cinco cânticos, que choram a queda da Cidade Santa Jerusalém em
No primiro cântico, o poeta e a cidade personificada lamentam a destruição de Jerusalém; reconhecem a culpa do povo.
No segundo cântico o autor lastima a punição de
Jerusalém e exorta a cidade à penitência (2,1-19); em 2,20-22, Jerusalém pede
misericórdia.
No terceiro cântico, o autor descreve a sua dor
diante da desgraça de Jerusalém e sua esperança na misericórdia divina.
] No quarto cântico, mais
uma vez é pranteada a ruína de Jerusalém castigada segundo a justiça.
O quinto cântico tem a forma de oração (“Oração do
Profeta Jeremias”, conforme a Vulgata latina), que implora a ajuda de Deus para
as vítimas da catástrofe de Jerusalém, Em 4,21s lê-se uma predição de ruína
para Edom, povo vizinho de Judá, que, após 87 a .C., longe de apoiar Judá vencido,
aproveitou-se da desgraça de Jerusalém.
A tradição atribui ao profeta Jeremias a autoria
das Lamentações, apoiando-se em 2Cor 35,25, que apresenta o profeta como autor
de Lamentações. Na verdade, Jeremias não teria dito que a inspiração profética
se havia esgotado (Jr 42,7-22 e Lm 2,9), nem teria esperado auxílio do Egito
(Jr 37,7s e Lm 4,17), nem teria elogiado o rei Sedecias (Jr 22,13-28; 37,1 7s e
Lm 4,20), nem teria apelado para a culpa dos pais (Jr 31,29 e Lm 5,7)... Mais:
o estilo espontâneo de Jeremias dificilmente se teria enquadrado dentro do
rígido artifício dos poemas acrósticos.
Em conseqüência, as Lamentações são atribuidas a
um ou mais autores anônimos há quem julgue que os cap. 1 e 5 são de autores
diferentes); terão sido redigidas na própria Terra Santa, sob o impacto recente
da catástrofe de 587 a .C.,
a finalidade terá sido litúrgica, isto é, as Lamentações devem ter sido
compostas para comemorar todos os anos a queda do Templo e de Jerusalém no dia
que os judeus consagravam a tal evento (9 do mês de Ab = julho/agosto). A
Igreja lê as Lamentações nos últimos dias da Semana Santa para relembrar o
drama do Calvário. É de notar que esses cânticos fúnebres são perpassados por
vivo sentimento de arrependimento e de inabalável confiança em Deus, o que dá valor permanente a esse pequeno livro.
BARUC
Baruc (= Bento) foi companheiro e amanuense ou
escriba de Jeremias profeta (Jr 3212 e Jr 36,26). Acompanhou o mestre no Egito
depois da queda da Cidade Santa (Jr 43,6-7). O livro atribuído a Baruc consta
de cinco capítulos e de um apêndice dito “Carta de Jeremias”, que a Vulgata
latina considera como o cap. 6 de Baruc.
Br 1--5 é uma coletânea de três peças, que supõem
o povo de Judá exilado na Babilônia: após uma introdução (1,1-4), que
estabelece a comunhão entre os exilados e os habitantes de Jerusalém, a
primeira parte (1,15-3.8) é uma oração de confissão dos pecados e de esperança
dos exilados, que imploram a misericórdia divina. A segunda parte (3,9-4,4) é
um poema sapiencial que identifica a sabedoria com a Lei de Deus e exorta Israel
a voltar para a fonte da sua felicidade, que é a observância da Torá (= Lei). A
terceira parte (45-5,9) é outro poema, no qual Jerusalém personificada se
dirige a seus filhos no exílio, exortando-os à coragem e à perseverança na fé
(4,5-29); depois do que o profeta consola Jerusalém atribulada, recordando-lhe
as promessas messiânicas (4,30-5,9).
A introdução
(1,1-14) foi escrita diretamente em
grego. O resto do livro deve ter sido redigido
originariamente em hebraico, mas atualmente só existe no texto grego dos LXX, a
partir do qual foram feitas traduções latinas. As características do livro
(especialmente o louvor à Sabedoria em Br 3,9-4,4) são da época posterior ao
exílio; há mesmo quem julgue tratar-se de obra de meados do séc. l a.C. Donde
se vê que Baruc não é o autor de tal livro; é de crer que os escritos relativos
à destruição de Jerusalém foram na tradição judaica atribuídos a Jeremias e a
Baruc. Este último também gozava de grande autoridade, pois lhe foram
atribuídos dois Apocalipses judaicos, um em grego e outro em siríaco, no século
II da era cristã. Dada a sua origem tardia, Br 1--6 não é livro reconhecido
pelos judeus como canônico; pertence, porém, ao cânon católico.
O cap. 6 de
Baruc ou epístola de Jeremias encontra-se nos manuscritos gregos do Antigo
Testamento logo depois de Lm, como livro à parte. Os textos latinos e sírios a
anexam a Br como sendo Br 6. O texto original parece ter sido hebraico.
A carta vem a
ser uma exortação aos exilados para que não caiam na idolatria do ambiente babilônico
em que se acham; chama a atenção para a inércia dos ídolos, que não têm vida e
são incapazes de ajudar.
Observemos os
refrões:
“Por
conseguinte, não os temais” (15.22.28.64.68) ou: “Como crer ou dizer que são
deuses?” (39.44.49.56) ou “Quem não vê que não são deuses?” (51.63.68).
O autor da
carta valeu-se de textos de profetas anteriores como Is 1,29; 2,18; Mq 1,7;
5,12s; Jr 2,5.8.25-29; 5,19; 11,12-13.
Mais
diretamente ainda o autor se inspirou em Is 40-55 e Jr 10,3-16. Além destas
fontes, o escritor consultou sua própria experiência: 6,3-5 (as pompas da
idolatria); 6,8-10.12-14.19 (os ornamentos das estátuas); 29.42s (os abusos do
culto).
O autor não é
Jeremias, como geralmente reconhecem os estudiosos; o título da carta é
elemento acrescentado posteriormente, talvez porque Jeremias foi autor da
epístola consignada em Jr 29. O texto deve-se a um anônimo, que pode ter
escrito no fim do séc. IV a.C., quando a idolatria da Babilônia tomava novo
surto. A finalidade é acautelar os judeus da diáspora e incitá-los à fidelidade
religiosa.
EZEQUIEL
Ezequiel (Deus dá força) era sacerdote (Ez 1,3),
casado, que perdeu a esposa pouco antes da queda de Jerusalém (Ez 24,16-18).
Foi chamado para a missão profética em 593 (Ez 1,2); exerceu seu ministério até
571 (Ez 29,17). Não se sabe bem onde nem quando morreu; uma tradição judaica
pouco segura diz que foi apedrejado pelos judeus em virtude das censuras que
lhes fazia. Por conseguinte, Ezequiel acompanhou o povo de Judá na fase mais
crítica da sua história, quando Jerusalém caiu sob Nabucodonosor (587 a . C.).
O livro de Ezequiel compreende quatro partes: após
a introduçâo (cap. 1 --3), na qual o profeta recebe sua missão, ocorre a 1ª
parte (cap. 4--24), com censuras aos judeus antes da queda de Jerusalém; a 2ª
parte (cap. 25--32) contém oráculos contra os povos estrangeiros; que agravavam
os males físicos e morais de Jerusalém; a 3ª parte (33--39) consola o povo
durante e após o cerco de Jerusalém, prometendo-lhe um futuro melhor; a 4ª
parte (40--48) descreve a nova cidade e o novo Templo após a volta do exílio.
Quem se lê o texto de Ezequiel, tem a impressão de
que toda a atividade do profeta se desenvolveu no exílio, onde foi chamado pelo
Senhor quando estava à margem do rio Cobar “na terra dos caldeus ( babilônios)”1,2.
Todavia nos últimos decênios esta tese tem sido
discutida. Com efeito, alguns críticos notam que os oráculos da primeira parte
do livro so dirigidos aos habitantes de Jerusalém; o profeta parece estar
fisicamente presente entre estes. Em conseqüência, tais autores admitem duas
fases no ministério profético de Ezequiel: a primeira terá ocorrido na Terra
Santa mesma entre 593 e 587; a segunda se terá desenvolvido na Babilônia de 587 a 571. Cada uma destas
duas fases terá sido provocada por uma vocação divina: a visão do rolo em 2,1--3,9
haveria desencadeado a missão em Judá, ao passo que a visão do carro divino em
1,4-28 e 3,10-15 teria dado início à atividade na terra do exílio.
Os críticos supõem que esta visão do carro divino
estivesse originariamente no início do cap. 33 (ponto de partida do ministério
na Babilônia), mas terá sido transposta para o início do livro, onde atualmente
se acha; em consequência desta transposição, o livro dá a entender que Ezequiel
só teve uma visão e vocação e, por conseguinte, um só ministério, a saber: na
terra do exílio. Os que defendem a nova hipótese, apelam para o fato de que o
livro de Ezequiel foi muito remanejado; isto explicaria a transladação da visão
do carro para o começo do livro; explicaria também as alusões à terra do exílio
(devidas a acréscimos tardios e inoportunos) ocorrentes na primeira parte do
livro, ou seja, em 3,23; 8,2-4; 10,152022; 11 ,24s.
Na verdade, a nova tese ajuda a resolver certos
problemas, mas suscita outros, pois, como se vê, exige sérias reestruturações
do texto (seriam, de fato, prováveis?) — Além disto, observa-se que, se
Ezequiel exerceu algum ministério na Palestina, ele devia morar fora da Cidade
Santa, pois era transportado para lá ( 8,3; 11,1). Também causa estranheza o
fato de que Jeremias profeta, contém partes de Ezequiel, no se refira a eSte se
Ezecuiel se achava na Palestina, e vice-versa; igualmente causa espécie o
silêncio de Ezequiel a respeito de falsos profetas e de cortesos de Jerusalém,
que tanto se opuseram a Jeremias e que certamente teriam impugnado Ezequiel se
este pregava na terra de Judá. Ponderadas estas dificuldades, pode-se dizer que
hoje a hipótese de duplo ministério está quase abandonada.
De resto, a tese tradicional (um só ministério,
exercido na Babilônia) no suscita problemas insolúveis: observemos que, quando
Ezequiel parece estar em Jerusalém, o texto diz que ele foi transportado para
lá, “em visão” (8,3) e que foi trazido de lá ‘em visão” (11,24); ademais as
censuras dirigidas por Ezequiel ao povo de Jerusalém podiam servir de lição aos
exilados (estes, até a queda de Jerusalém em 587 a . C., julgavam que eram
inocentes, punidos por causa dos pecados de seus antepassados: “os pais comeram
uvas verdes e os dentes dos filhos ficaram irritados”, Ez 18,2).
O livro de Ezequiel apresenta a pregação profética
de Ezequiel na primeira pessoa do singular; apenas dois versículos estão na
terceira pessoa (1,3 e 24,24). O livro tem assim uma certa unidade. Mas deve-se
notar que não foi escrito de uma só vez nem é todo diretamente da mão do
profeta Ezequiel; é de crer que tal obra seja devida a discípulos, que
trabalharam a partir de escritos e recordações do mestre, combinando-os entre
si e completando-os.
Os indícios de compilação são vários:
— repetiçóes: 3,17-21 e 33,7-9; 18,25-29 e 33,
17-20; 7,1-4 e 7,5-9; 1,4-2,2 e 10,1.8-17;
— inserções: a visão do carro divino (1,4-3,1 5) é interrompida pela do livro (2,1-3,9). O relato de 10,1-22 só continua em 11,22, cortado pela descrição dos pecados de Jerusalém ;
— as datas fornecidas nos cap. 26--33 não seguem ordem cronológica; 26,1; 29,1; 30,20; 31 ,1; 32,1; 32,17; 33,21.
Todavia é de se dizer que os discípulos foram
fiéis ao mestre, pois conservaram, além do uso da primeira pessoa do singular,
a unidade de estilo e de expressões: “Filho do homem”, “Sabereis que eu sou o
Senhor...“, “Foi-me dirigida a palavra do Senhor...“, “Fez-se a mão do Senhor
sobre mim...”
Ezequiel recorre frequentemente a gestos
simbólicos: 4,1 -5,4; 12,1 -7; 21 ,23s; 24,22-24; 37,1ss. também dado a visões:
1,1;1,4-28; lOs;37,1-14;43,1-7, textos estes que põem o leitor diante de
quadros fantásticos.
Também revelam fecunda imaginação as alegorias
referentes às duas irmãs Oola e Ooliba (cap. 23), ao naufrágio de Tiro (ap.
27), ao faraó-crocodilo (cap. 29 e 32), à árvore gigante (cap. 31).
O livro de Ezequiel traz também forte marca
sacerdotal. Preocupa-se com o Templo e o culto sagrado; tem pontos de contato
com a Lei de Santidade (Lv 17-26). Assim é obra da corrente sacerdotal que
trabalhou no exílio e no pós-exílio, produzindo também o código P ou
Sacerdotal, que entrou na composição do Penateuco.
DANIEL
Daniel (Deus é meu juiz, em hebraico) é o
principal personagem do livro homônimo. Deve distinguir-se do sábio Danel de
que fala Ez 14,14.20; 28,3; este, colocado junto a Noé e Já, não era israelita,
ao passo que o herói do nosso livro era judeu.
O livro de Daniel compreende uma parte canônica
(1,1-12,13, com exceção de 3,24-90) e outra deuterocanônica, só existente em
grego (13,1-14,42, além de 3,24-90).
A parte canônica divide-se
em duas seções: narrativa (1,1 -6,28) e apocalíptica (7,1-12,13).
A parte deuterocanônica
contém a história de Susana, uma jovem inocente que Daniel salva por sua
sabedoria (13,1 -64), a história dos sacerdotes de Bel, que Daniel desmascara
(14,1-21), e a do dragão, que Daniel mata (14,22-42); estes episódios do cap.
14 são eco da polêmica judaica contra a idolatria que inspira a seção de Dn 1--6,
ao passo que o cap. 13 põe em relevo a sabedoria de Daniel, já salientada em 1--6.
Muito se tem discutido o
gênero literário do livro protocanânico de Daniel. Hoje os exegetas católicos
concordam em atribuir 1--6 ao gênero midráxico ou hagádico e 7--12 ao gênero
apocalíptico. Mais precisamente:
Em Dn 1--6 temos um núcleo histórico: Daniel foi
um hebreu deportado para a Babilônia em 606 (1,1); levado para a corte do rei
Nabucodonosor, recebeu o nome de Baltassar (1,7); guardou estrita fidelidade à
Lei de Deus em meio ao ambiente pagão, de modo que Deus o enriqueceu com dons
diversos de sabedoria, que o tornaram notável na corte da Babilônia. Tal é o
conteúdo do cap 1 o que se segue nos cap. 2--6 são episódios cujo fundo
histórico foi elaborado em sentido apologético, isto é, no intuito de
escarnecer a sabedoria pagã e exaltar o Deus de Daniel, fonte da verdadeira
sabedoria: note-se que em cada um desses capítulos há uma situação que deixa
embaraçados o rei e seus cortesãos ou sábios e que é resolvida pela atuação de
Daniel; no final de cada capítulo, o rei pagão reconhece direta ou
indiretamente a santidade do Deus de Daniel: 2,46-48; 3,95s; 4,34; 5,29;
6,25-27.
Há sinais claros de que o
autor não se importa muito com o rigor histórico das suas narrativas ou não
tencionava cultivar o gênero historiográfico propriamente dito. Com efeito;
apresenta Baltasar como rei da Babilônia (5,30; 7,1) e filho de Nabucodonosor
(5,2), quando na verdade Baltasar foi filho de Nabonide e talvez nunca tenha
reinado. Dano, o medo, tido como sucessor de Baltasar (6,1) e filho de Xerxes
(9,1), é desconhecido aos historiadores (talvez se trate de pseudônimo); em
11,2 aparece uma lista de quatro reis da dinastia persa, quando na realidade
houve nove deles. Estas imprecisões são características do gênero literário
midráxico ou hagádico: o autor de midraxe não quer ser um cronista nem um
repórter, mas, sim, um filósofo ou um teólogo, que, através de acontecimentos
históricos devidamente apresentados, comunica uma mensagem de índole religiosa;
já que o autor de midraxe não quer ser um historiador, não deve ser acuasado de
incidir em erros historio-gráficos; não é intenção dele definir pontos de história.
Julga-se, pois, que os
episódios de Dn 2--6 foram redigidos por um autor muito posterior a Daniel,
isto é, do século II a. C., que desejava incutir nos judeus a confiança no Deus
de Israel. Este é mais forte do que todos os poderes humanos, especialmente os
reis sírios, que perseguiam os judeus, ameaçando punir os que se conservassem
fiéis à Lei do Senhor.
A seção de Dn 7--12 é apocalíptica. Isto quer dizer o seguinte: no séc. II a C., quando os judeus eram ameaçados pelos sírios pagãos (167-164), um autor piedoso quis despertar em seus compatriotas a esperança e a paz. Em vista disto, recapitulou a história dos últimos séculos e apresentou a sua época como próxima à libertação messiânica; Deus haveria de intervir em breve a fim de sacudir o jugo estrangeiro que dominava Israel desde Nabucodonosor, e instaurar no mundo a justiça e a ordem devidas; os que ficassem fieis, seriam recompensados. Precisamente a descrição do julgamento de Deus sobre os povos dentro de um cenário cósmico que caracteriza os escritos apocalípticos. O gênero apocalíptico já ocorre antes de Daniel em Ez 38s; Is 24-27; Zc 9-14.
No cernário apocalíptico em Dn 7,1-28 situa-se um
texto profético, relativo ao Filho do Homem e ao seu reino definitivo sobre
todas as nações: 7, 13s. Estes versículos projetam luz sobre o apelativo Filho
do Homem com que Jesus se apresentou nos Evangelhos: é um título messiânico,
que devia ter profundo significado para os seguidores de Jesus. Aliás, foi
aludindo a tal passagem que Jesus se identificou quando interrogado pelo Sumo
Sacerdote judaico antes de morrer: “Eu sou o Cristo, o Filho de Deus bendito, E
vereis o Filho do Homem sentado à direita do Todo-Poderoso e vir com as nuvens
do céu” (Mc 14,62; Jo 3,13s; 5,27; 8,28. .
Estas considerações nos levam a dizer que o livro
de Daniel não é um livro profético (embora contenha umas poucas passagens
proféticas: 2,34.44s; 7,13s; 12,1-3), um midraxe (2--6) e um apocalipse (7 a 12): o autor no séc. lI a.
C. refere sob forma de símbolos (geralmente feras) a história dos impérios que
dominaram Israel desde Nabucodonosor até os Sírios (167-163 a . C.) a fim de dizer aos
seus contemporâneos do século II que o jugo estrangeiro está para chegar ao
fim, porque o Senhor Deus estava para entrar manifestamente na história deste
mundo, realizando o juízo sobre os povos e premiando o povo fiel, por isto que
o livro de Daniel, no cânon dos judeus, não se encontra entre os profetas, mas,
sim, entre os escritos sagrados que formam a última parte do cânon hebraico.
A edição dos LXX é que
colocou Daniel na categoria dos profetas, interpretando o seu texto como se
fosse o de um profeta. É de notar, porém, que o estilo de Daniel difere claramente
do dos profetas: descreve minuciosamente a sucessão dos remos do século VI ao
séc. II referindo-se a pormenores muito precisos — o que não é do estilo dos
profetas; estes geralmente são obscuros quando se referem à história.
As partes deuterocanônicas
(cap. 13--14) pertencem ao gênero literário de 2--6, referindo episódios que
mostram a sabedoria de Daniel e a grandeza do Deus de Israel.
O texto do livro de Daniel apresenta um problema
para o qual os estudiosos não encontram explicação. Com efeito, foi nos
transmitido em três linguas: 1,2-2,4a, em hebraico; 2,4b-7,28, em aramaico (com
exceção de 3,24-90, parte deuterocanônica); as partes deuterocanônicas, em
grego.
Esta diversidade talvez provenha
do fato de que o livro de Daniel consta de seções que foram originaria- mente
redigidas sem dependência uma da outra. Terão sido compiladas em primeira
instância de modo a originar os blocos 1--6 e 7--12; em ulterior instância, ou
seja, entre 167 e 164 terão sido justapostas de modo a produzir o livro de
Daniel protocanônico. Os cap. 13--14 terão tido sua origem própria como
episódios avulsos; foram aglutinados ao conjunto Dn 1--12; como se crê, são a
tradução grega de um texto original hebraico que se perdeu. Notemos que no
livro de Daniel não há as características dos livros do exílio e do imediato
pós-exilio: lamentações sobre Jerusalém, censura ou consolação aos exilados,
promessa de retorno à Terra Prometida, como se encontram em Ezequiel, Lamentações,
lsaías 40--55
O livro de Daniel tem importância teológica, pois
apresenta o modo de pensar dos judeus do século II a. C. ou quase no limiar da
Revelação Cristã:
Observemos aí:
— a angelologia (doutrina a respeito dos anjos)
muito evoluída; Dn
7,1 0.16; 8,16-18; 9,21 -23; 10,10-21; 12,1 -13;
7,1 0.16; 8,16-18; 9,21 -23; 10,10-21; 12,1 -13;
— a afirmação da ressurreição para a vida ou para
o opróbrio; Dn 12,2s (passo notável em relação a Jó e Ecl;
— a visão da história corno realização de um sábio
plano de Deus que termina no Reino Messiânico consumido (cap. 2; 7--8; 10--12).
Os profetas menores
Os profetas Oséias, Amós, Miquéias, Joel,
Abdias, Jonas, Naum, Habacuc, Sofonias, Ageu, Zacarias, Malaquias são chamados
‘menores”, não porque tenham pouca importância, mas porque nos deixaram
escritos pequenos, que já no séc. II a.C. eram colecionados num só volume, mais
ou menos igual ao volume de um dos profetas maiores (Is, Jr, Ez); o
Eclesiástico, escrito no século III aC., supôe já realizada a compilação dos
doze profetas num só rolo; cf. Eclo 49,10.
O texto hebraico, o grego dos LXX e a Vulgata
latina chamam-nos “os doze Profetas”. A designação de “profetas menores”
aparece pela primeira vez em
S. Agostinho , + 430.
A ordem dos profetas menores no catálogo sagrado
varia no texto hebraico e no dos LXX. Não é cronológica; torna-se difícil
assinalar a época precisa de um ou outro desses homens de Deus, Como quer que
seja, eles recobrem um período que vai do séc. VIII ao séc. III a.C.;
fornecem-nos dados importantes para o nosso conhecimento da história de Israel
e dos povos vizinhos. Os seus escritos breves e cheios de imagens apresentam
especiais dificuldades para o intérprete; aludem a fatos históricos e
pormenores dos costumes do Israel antigo de maneira sucinta.
O texto dos LXX coloca os profetas menores antes
dos maiores. A seguir, apresentaremos breves notas introdutórias em cada
profeta menor, seguindo a provável ordem cronológica, e não a ordem do Cânon;
estas notas serão entendidas se o estudioso tiver ante os olhos uma tabela cronológica
da história do Antigo Testamento, com atenção especial para a queda de Samaria
(721) e a de Jerusalém (587); o exílio na Babilônia ocorreu de 587 a 538.
De Amós a Habacuc
Amós era natural de Técua (Judá); cf. 1,1. Pastor de gado e
cultivador de sicômoros (7,14); era homem simples, de linguagem franca e rude.
Exerceu (o ministério profético por chamado de Deus (7,5), que o levou para o
Reino da Sarnaria, onde profetizou sob o rei Jeroboão II (783-743 aC .). Este monarca foi
próspero em seus empreendimentos e dilatou as fronteiras do reino (cf. 6,14;
2Rs 14,25). O bem-estar provocou o luxo na construção das casas (3,15; 5,11;
6,8), depravação dos costumes (2,6-8; 4,1; 6,1-6), culto idolátrico (4,4;
5,21-23; 8,14). As calamidades passadas não tinham deixado recordação na mente
do povo (4,6-11); este esperava o dia do Senhor (dia do julgamento final) corno
se fosse ocasião de mais bem-estar para Israel (5,18-20; 9,10).
Em meio à prosperidade, ressoou a voz de Amós
censurando os vícios, principalmente nas cidades em que os reis cismáticos de
Israel tinham construído santuários: Samaria (3,9; 4,1; 6,1-6), Gálgala (55) e
Betel (4,4; 5,5s; 7,13). Toda a população de Samaria foi severamente
repreendida, principalmente os chefes e maiorais; a queda do reino, que
ocorreria em 721. Incomodado pelo profeta, Amasias, que devia ser o responsável
pelo Templo em Betel, denunciou Amós ao rei ‘Jeroboão (7,10) e expulsou o
profeta para a sua pátria (Judá); 7,13s. Amós soube predizer também a salvação
para os bons; é ele quem, pela primeira vez, utiliza a expressão “o resto” de
José, para designar os poucos que não se tenham contaminado e com os quais Deus
recomeça a sua obra; cf. 5,15, A expressão volta na pregação dos profetas
posteriores; cf. Jr 6,9; 31,7; Mq 2,12; o ministério de Amós deve ter sido
breve (dois anos apenas Cf. 1,1).
Oséias pregou no
reino setentrional da Samaria sob Jeroboáo II (783-743); provavelmente assistiu
à queda da Samaria, pois em 1,1 está dito que profetizou sob Ezequias de Judá
(716-687). Foi, portanto, testemunha da prosperidade política e material de sua
gente, levada, por isto, à corrupção dos costumes e à idolatria. O seu livro se
divide em duas partes:
— as relações entre Javé e Israel são simbolizadas pelo casamento de Oséias. Este se casa com uma mulher leviana (Gomer), que o engana; cai na escravidão, depois de abandonar Oséias, mas é resgatada por este, que a recebe de novo como esposa. Julga-se que o epsódio assim relatado (Os 1-3) é fato histórico; serviu para significar a união entre o Senhor e seu povo, violada pelas infidelidades de Israel, que aderiu aos deuses de Canaã;
— Israel é censurado por sua prevaricação política e religiosa do momento presente (4,1-9,9) e do passado (9,10-14,1). O livro se encerra com uma liturgia de penitência (14,2-10). O tema principal do livro é o amor de Javé por seu povo infiel.
— as relações entre Javé e Israel são simbolizadas pelo casamento de Oséias. Este se casa com uma mulher leviana (Gomer), que o engana; cai na escravidão, depois de abandonar Oséias, mas é resgatada por este, que a recebe de novo como esposa. Julga-se que o epsódio assim relatado (Os 1-3) é fato histórico; serviu para significar a união entre o Senhor e seu povo, violada pelas infidelidades de Israel, que aderiu aos deuses de Canaã;
— Israel é censurado por sua prevaricação política e religiosa do momento presente (4,1-9,9) e do passado (9,10-14,1). O livro se encerra com uma liturgia de penitência (14,2-10). O tema principal do livro é o amor de Javé por seu povo infiel.
Miquéias profetizou sob Joatã, Acaz e Ezequias, reis de
Judá (740-690). Deve ter conhecido a queda de Samaria em 721 e a invasão de
Senaquerib em Judá (701); cf. 1,2-16, 3,12; 4,9-11.14. O profeta Jeremias cita
um de seus oráculos contra Judá em Jr 26,18; cf, Mq 3,12.
O livro compreende quatro partes, onde se alternam
censuras e promessas: 1,12-3,12, processo contra Samaria e Judá; 4,1-5,14,
promessas a Sião (incluindo notável profecia messiânica em 5,1-4a); 6,1-7,7,
novo processo contra Israel; 7,8-20, cântico de restauração de Jerusalém.
Miquéias não poupa os
homens gananciosos, os credores sem compaixão, os comerciantes fraudulentos, as
famílias divididas, os sacerdotes e os profetas cobiçosos, os chefes tirânicos,
os juizes venais, e propõe o quadro ideal: “praticar a justiça, amar com
misericórdia e proceder humildemente diante de Deus” (6,8), o que resume a
doutrina dos profetas em geral.
Sofonias exerceu sua atividade sob o piedoso rei Josias (640-609)
ou, mais precisamente, antes da reforma religiosa empreendida por este monarca
em 622 (.cf. 2Rs 22,3-23,21), pois o profeta censura o culto de falsos deuses
(1,4s), os ministros da corte real (1,8s; 3,3), as moda estrangeiras (1,8), os
falsos profetas (3,4), as injustiças sociais (3,1-3), males aos quais Josias
procurou dar um fim em 622.
O livro divide-se em
quatro breves partes: 1,2-2,3, o Dia de Javé; 2,4-15, oráculos contra as nações
pagãs; 3,1-8, vaticínios contra Jerusalém; 3,9-20, promessas de salvação para
os gentios e para Israel.
A mensagem principal de
Sofonias é o anúncio do Dia do Senhor,. tema já abordado por Am 5,18-20 Is
2,10-22; o quadro traçado pelo profeta tem dimensões cósmicas (1,14-18) e
recorre a imagens muito significativas (1,7.10s.12; 2,2). O Senhor salvará o
resto do seu povo (2,9; 3,13), que lhe servirá na humildade, na piedade e na
justiça (2,1-3; 3,11-17).
Naum era natural de Elcós, cidade a nós desconhecida (cl. 1,1). Trata
unicamente da iminente queda de Ninive, capital do império assírio, que
ameaçava e subjugava as populações do Próximo Oriente e, em particular, de
Judá. Começa por um salmo que descreve a esplendorosa manifestação de Javé, juiz
dos povos (1,2-8); a seguir, propõe em duas cenas a ruína de Ninive: 1,9-2,14,
a descrição profética da queda da cidade; 3,1-19, a lamentação sobre a
cidade destruída.
O livro é pouco anterior à perda de Nínive em 612.
Exprime o calor da alma de Israel diante do seu inimigo tenaz, o povo assírio,
como também revela as esperanças suscitadas pela previsão de sua queda. Através
dessas páginas, perpassadas por forte nacionalismo, exprime-se um ideal de
justiça e de fé: a ruína de Nínive corresponde a um juízo de Deus, que castiga o
inimigo do plano do Senhor (1,11; 2,1) e o opressor dos povos (1,12s; 3,1-7).
Is 52,7 retoma a imagem de Na 2,1 para descrever a mensagem da salvação.
Habacuc profeta não
deve ser identificado como o homônimo de Dn 14,32-38. O seu livro versa sobre o
tema “Por que o ímpio prevalece contra o justo e insolentemente o oprime?” O
Senhor responde apontando a queda final dos ímpios e a libertação dos justos. A
temática assim e desenvolve: 1,2-11; primeira lamentação (1,2-4), à qual o
Senhor responde dizendo que suscitará os caldeus para punir os ímpios (1,5-11);
1,12-2,20, segunda lamentação (1,12-17), diante da qual o Senhor promete vencer
o opressor (2,1-20); 3,1-19, salmo do triunfo final de Deus. Muito
provavelmente os ímpios que o profeta tem em vista, são os assírios, contra os
quais o Senhor havia de suscitar os caldeus, isto é, os babilônios; estes, de
fato, tomaram Nínive em 612 e puseram fim à hegemonia assíria. — Habacuc
apresenta uma nota nova: ousa pedir contas a Deus do seu governo no mundo; o
problema do mal escandaliza o profeta; em resposta, Habacuc ouve que, por
caminhos paradoxais, Deus prepará a vitória final do direito; entrementes, o
justo vive pela sua fidelidade (cf. Hab 2,4; Rm 1,17; GI 3,11; Hb 10,38).
De Ageu a Jonas
Ageu dá início ao último período dos profetas, que se segue logo ao exílio (587-
Ageu acompanha o povo
recém-tornado do cativeiro babilônico (587-538 a .C.). Essa gente era
hostilizada pelos estrangeiros residentes na Judéia e nos países vizinhos (Esdr
4,1-4); era também acabrunhada pela penúria (Ag 1,6,105; 2,175; Zc 8,10).
Diante das ameaças do desânimo e da inércia, o profeta exortou os seus
compatriotas a retomarem a obra de reconstrução do templo do Senhor em Jerusalém. Proferiu
duas exortações entre o final de agosto e meados de dezembro de 520. Apresenta
a reedificação do templo como a condição da vinda de Javé e do seu reino.
O livro de Zacarias compreende duas partes bem distintas: 1,8 e
9,14. Depois de uma introdução (1,1-6), datada de outubro-novembro de 520, dois
meses após a primeira profecia de Ageu, o livro refere oito visões do profeta,
que tratam da restauração e da salvação de Israel (1,7-6,8); seguem-se oráculos
messânicos (6,9-8,23). Este conjunto é certamente da autoria do profeta
Zacarias.
A segunda parte (9-14) é muito diferente. Os
oráculos não apresentam data e são anônimos; não falam nem de Zacarias nem da
reconstrução do templo. Julga-se que foram redigidos nos últimos decênios do
séc. IV a.C., após o reinado de Alexandre Magno (323). Carecem de unidade, pois
constituem duas seções, cada uma das quais tem um título ( 9,1 e 12,1) — o que
tem levado os estudiosos a falar de Dêutero-Zacarias e Trito-Zacarias (como faIam
de Segundo lsaías e Terceiro lsaías). O 2ºZacarias refere-se a fatos históricos
difíceis de precisar; o 3º é um apocalipse que descreve as glórias da Jerusalém
dos últimos tempos.
Malaquias significa
“meu mensageiro”. Pergunta-se se é o nome de um profeta ou um apelativo
genérico (cf. 3,1). O livro consta de seis seções que seguem o mesmo
esquema: o Senhor lança uma afirmação; o povo ou os sacerdotes a contestam, mas
Javé (geralmente em tom repreensivo) a sustenta. Dois grandes temas são
abordados nesses oráculos: as faltas dos sacerdotes e dos fiéis na celebração
do culto divino (1,6-2,9 e 3,6-12), o escândalo dos matrimônios mistos e dos
divórcios (2,10-16).
O Profeta anuncia o Dia do
Senhor, que purificará sacerdotes e levitas, punirá os maus e concederá aos
justos o triunfo (3,1-5.13-21), A promessa da vinda de Elias, que precederá o
dia do juízo final, parece ser um acréscimo posterior (mas, sem dúvida, parte
canônica do livro). Este escrito supõe o culto já restaurado no Templo (515),
mas é anterior à proibição dos matrimônios misto, devida à reforma de Esdras e
Neemias em 445 a .C.
(Esdr 9s; Ne 10,28-31; 13,23-31).
Abdias é o mais curto dos livros proféticos e um dos mais difíceis,
Segundo alguns autores, o livro foi dirigido contra Edôm, povo vizinho de Judá,
sob o rei Jorã (848-841), pois naquela época os árabes e os filisteus
devastavam Judá (Ab 11; 2Cr 21,16). Outros distinguem entre Proto-Abdias
(1-10), do tempo de Jorã, e Dêutero-Abdias (11-21), posterior à queda de
Jerusalém (587 aC .).
Outros, por fim, mais sabiamente atribuem o livro ao período do exílio, pois os
vv. 11-14.15b se referem ao ódio dos idumeus por ocasião da queda de Jerusalém
em 587 (ct. Ez 25,12-14; 35,ls; Lm 4,21s; SI 136 ou 137,7). O livro exalta a
justiça e o poder de Javé, que age como defensor do direito (15s),
O livro de Joel compreende
duas partes: 1,2-2,27 refere-se a uma invasão de gafanhotos que flagela Judá e
dá ocasião a uma liturgia de luto e súplica; o Senhor responde prometendo pôr
termo à praga e restaurar a fartura; 2,28-3,21 descreve o Dia do Senhor,
caracterizado pela efusão do Espírito, o juízo sobre as nações e a restauração messiânica
do povo eleito. A unidade das duas partes é efetuada pela menção do Dia do
Senhor, que é propriamente o tema dos cc. 3-4, mas que já é apontado em 1,15;
2,ls.lOs.
Os gafanhotos da primeira parte não hão de ser
interpretados em sentido alegórico, como se significassem inimigos provenientes
do Norte; trata-se de verdadeira praga, que é tomada como figura dos
acontecimentos que antecederão imediatamente o Dia do Senhor (aliás, este é
mencionado na primeira parte). A segunda seção de JI tem características de um
apocalipse, gênero literário que descreve a intervenção final de Deus na
história, com abalo da natureza.
O livro data do pós-exílio ou do ano de 400 a .C. aproximadamente,
pois não menciona rei em Judá, mas apenas anciãos e sacerdotes (1,9.13.16;
2,1,15,..); há referências à dispersão do povo de Deus entre os gentios (3,2),
à venda de judeus como escravos aos gregos (4,6). O livro de Joel vem a ser um
compêndio da escatologia judaica.
Jonas difere de todos
os outros livros proféticos. Narra a história de um profeta que recusou a ordem
do Senhor para que fosse pregar aos ninivitas. Milagrosamente colhido pela
Providência, Jonas vai a Nínive e consegue converter a grande cidade. Eis,
porém, que se entristece por haver comunicado a mensagem da fé a pagãos. Então
Deus lhe afirma que a misericórdia divina atinge todos os povos.
Hoje concordam os
estudiosos em reconhecer que o livro é uma narração didática, teológica, e não
histórica. O autor apresentou Jonas como o tipo do judeu nacionalista, fechado
em seu patrimônio religioso. Esse judeu é censurado pelo Senhor, que o leva a
compreender que a salvação é destinada a todos os homens. O livro, portanto, é
um testemunho do universalismo que seria impondo à mentalidade dos judeus em
meio aos preconceitos nacionalistas que levavam os judeus do séc. V a.C. a
recusar a salvação aos não-judeus. Sendo de época tão tardia, vê-se que o livro
não é da autoria nem refere as façanhas do profeta Jonas mencionado em 2Rs
14,25 nos tempos do rei Jeroboão 11(783-743).
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